Paula Martinelli, doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, conta um pouco do seu estudo relacionado à produção fotográfica do artista brasileiro Eustáquio Neves. A pesquisadora relata algumas questões que atravessam a obra do artista e compartilha um pouco sobre o seu próprio processo de pesquisa, dentro do âmbito dos estudos dos processos de criação na fotografia.

1.      Paula, quem é Eustáquio Neves? 

É um artista brasileiro que transita por diversas linguagens – transpõe a fotografia às artes visuais e vice-versa.

2.       Do que trata a sua obra? 

Do Brasil, de nossa história violenta e dos que foram silenciados por ela. Um trabalho bonito de memória e de resgate.

3.       Como você chegou até ele ou conheceu o seu trabalho? 

Conversando com uma grande amiga sobre artistas que evitam o tecnicismo na fotografia. Depois visitei o ateliê dele, onde tive acesso a seus arquivos de criação. 

4.       Quais as contribuições da sua pesquisa para o ampliamento das discussões sobre a obra do artista? 

Sempre tive um certo incômodo em relação ao formalismo das análises acadêmicas sobre arte, ao tecnicismo e à ideia de ‘imagem pela imagem’. A meu ver, esse tipo de análise serve à afirmação de autoridade – de poder – sobre um trabalho que deveria ser lido livremente, o que é muito comum nas discussões teóricas e curatoriais. Minha intenção com a pesquisa era refutar essa abordagem e mostrar que existem outros caminhos que não incorrem na falsa ideia de autoridade interpretativa.   

5.       Como a teoria dos processos de criação te ajudou a olhar o artista?

Com uma abordagem que mostrou-se fundamental para minha pesquisa. Foi um alívio  encontrar uma teoria que considera o sujeito-autor ao mesmo tempo em que desmistifica a criação; que reconhece erros, acasos e interações das mais diversas – com interlocutores, com os materiais e com as linguagens – como integrantes do processo, como substrato daquilo que vemos e chamamos de obra. 

6.       Quais aspectos da teoria estão presentes na sua pesquisa?

A ideia das redes de criação é muito ampla e dentro dela há diversos caminhos possíveis. Além disso, ela acolhe o diálogo com outras áreas do conhecimento – da psicanálise aos estudos contemporâneos sobre história da arte e fotografia. Cecilia Salles, minha orientadora e formuladora da teoria sobre os processos de criação, sempre me encorajou a dedicar olhar atento ao objeto de pesquisa para identificar nele a necessidade teórica. Escolhi partir da própria fala Eustáquio Neves, na qual o artista diz trabalhar com tempo e memória. Então, utilizei o instrumento teórico para dar início a uma discussão que me acompanha ainda hoje, em minha pesquisa de doutorado: a produção artística e a constituição do sujeito. 

7.       Como as discussões sobre os processos de criação ajudam a compreender as manifestações artísticas de um modo geral?

Reconhecer o processo é desenvolver um modo de olhar que modifica a relação com as artes em geral. Conseguimos nos afastar da primazia da visibilidade e passamos a reconhecer no trabalho artístico um esforço de vínculo. Também passamos a entender que a criação não é um ato isolado, ela depende da interação, acontece também naqueles que contemplam. Os gênios e as obras-primas desaparecem e dão lugar a uma perspectiva que, a meu ver, é mais complexa e bonita.  

8.       Em poucas palavras, ofereça uma visão geral sobre as discussões presentes na sua pesquisa

Todos nós produzimos imagens – seja na comunicação utilitária da rotina ou em ateliês. Algumas dessas imagens, aquelas que se encaixam em um local específico do ideário social, recebem o nome de arte. No entanto, todas elas mediam nosso contato com a realidade e são, em última análise, mosaicos daquilo que nos constitui, nossos conflitos, desejos e também o conteúdo inconsciente. 

9.       Cite outras referências que contribuíram para o desenvolvimento do seu trabalho, tanto artísticas quanto acadêmicas

No campo teórico, destaco Sigmund Freud, Cecilia Salles, Jeanne-Marie Gagnebin, Georges Didi-Huberman, Aby Warburg, Walter Benjamin.

Nas artes, Helena Almeida, Dirceu Maués, Andrei Tarkovsky, Arthur Bispo do Rosário e Gerhard Richter. 

Quer conhecer um pouco mais sobre o trabalho da pesquisadora? Acesse o link do seu CV ou deixe uma mensagem!

Categories: Diálogos

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